Gravação de conversa pode ser usada como prova na Justiça
A gravação de conversa
feita por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro para fins de
comprovação de direito não é ilícita e pode ser usada como prova em ação
judicial. Foi o que fez um técnico de telefonia ao se sentir pressionado a
pedir demissão – ele gravou conversas com os donos e a contadora da empresa em
que trabalhava com um aparelho de MP3. Ao examinar o caso, a Justiça do
Trabalho considerou que a gravação feita pelo trabalhador é prova lícita.
Na
ação que apresentou na 11ª Vara do Trabalho de Recife, em Pernambuco, o técnico
contou que foi contratado pela Luleo Comércio para fazer instalação e
manutenção de rede de acesso de telecomunicações para a Telemar Norte Leste.
Aproximadamente três meses após a contratação, sofreu acidente de trabalho e
passou a receber auxílio previdenciário.
Quando
retornou à empresa, como não havia mais o contrato com a Telemar, o empregado
foi designado para ocupar a função de telefonista. Gravações em um cd (“compact
disc”) juntado ao processo confirmaram que o trabalhador sofreu pressões para
pedir demissão antes do término do período de estabilidade provisória
acidentária de um ano a que tinha direito.
Segundo
a sentença, a coação foi sutil, com insinuações de que o empregado ficaria fora
do mercado de trabalho e poderia não mais prestar serviços por meio de outras
empresas terceirizadas à Telemar. Disseram também que não “pegava bem” ele ter
trabalhado apenas três meses (entre a admissão e o acidente) e a Luleo ter que
mantê-lo em seus quadros por um ano em razão da estabilidade acidentária.
Assim,
a juíza entendeu que a dispensa do empregado tinha sido imotivada e concedeu,
em parte, os pedidos formulados, tais como o pagamento de diferenças salariais,
aviso-prévio e FGTS com multa de 40%. Declarou, ainda, a responsabilidade
subsidiária da Telemar pelos créditos trabalhistas devidos ao técnico em caso
de inadimplência da Luleo, pois, na condição de tomadora dos serviços, beneficiou-se
da força de trabalho do empregado (incidência da Súmula nº 331 do Tribunal
Superior do Trabalho).
O
Tribunal do Trabalho da 6ª Região (PE), por sua vez, manteve o entendimento da
primeira instância quanto à licitude da gravação feita pelo empregado e negou
provimento ao recurso ordinário da Telemar. Para o TRT, os diálogos foram
realizados no ambiente de trabalho, sem violação à intimidade e privacidade das
pessoas envolvidas, e em conformidade com o artigo 225 do Código Civil de 2002,
que admite gravação como meio de prova.
No
recurso de revista que apresentou ao TST, a Telemar defendeu a tese de que a
gravação de conversa feita sem o conhecimento dos interlocutores era ilícita e
não servia como prova. Alegou ofensa a direitos constitucionais, como o
respeito à vida privada das pessoas, ao livre exercício do trabalho e à vedação
da utilização de provas no processo obtidas por meio ilícito (artigo 5º, X,
XIII e LVI, da Constituição Federal).
Entretanto,
de acordo com o relator e presidente da Terceira Turma do Tribunal, ministro
Horácio Senna Pires, as alegações da empresa em relação à clandestinidade da
gravação não torna a prova ilícita. Isso porque os diálogos também pertencem ao
trabalhador que gravou a conversa com a intenção de comprovar um direito.
O
relator explicou que o Supremo Tribunal Federal já julgou diversos casos no
sentido de que a gravação de conversa nessas condições não se enquadra na
vedação do uso de provas ilícitas de que trata o artigo 5º, LVI, da
Constituição. O ministro Horácio destacou ainda o julgamento de um processo em
que o STF reconheceu a repercussão geral da matéria.
Desse
modo, como o relator concluiu que a gravação é prova lícita no processo e
inexistiram as violações constitucionais mencionadas pela empresa, a Terceira
Turma, por unanimidade de votos, rejeitou (não conheceu) o recurso de revista
da Telemar nesse ponto. (RR-162600-35.2006.5.06.0011)
(Lilian Fonseca)