PROJETO ESOCIAL: NÃO PRECISAMOS DE UM “MINEIRAÇO” DIGITAL

 

As lições de um fracasso futebolístico para o projeto eSocial

 

Atualizado por Leonardo Amorim em 16/07/2014 19h15

 

 

A última entrevista do treinador da seleção brasileira, Luis Felipe Scolari, o Felipão, foi marcada por uma fria e breve análise dos resultados da “canarinha” nos últimos oito anos. Scolari fez questão de enfatizar que em 2014, houve a melhor colocação do Brasil desde 2006.

 

Um desavisado ao assistir à entrevista, sem saber o que realmente ocorreu nas partidas disputadas nesta Copa, principalmente nas últimas duas, certamente ficará convencido de que o Felipão fez um bom trabalho.

 

 

 

 

 

Os números supostamente favoráveis a Felipão, são lançados sem qualquer análise mais profunda do contexto,

justamente para que tudo se pareça correto e que o desastre do Mineirão seja considerado uma “fatalidade”

 

 

 

Não basta apenas ouvir as críticas...

 

O desastre da seleção do Felipão tem sido objeto até de debates entre pensadores que não costumam falar sobre futebol. Por que?  Há várias lições que podem ser tomadas a partir desta traumática experiência no jogo com a campeã Alemanha.

 

Aproveitando o momento e trazendo para o cenário do projeto eSocial, que vem fracassando desde 2010, quando começou com outro nome, a verdade é que as tentativas para faze-lo funcionar foram frustradas por diversos fatores.

 

Se o Felipão e sua comissão técnica se mostraram insensíveis às críticas, preferindo se esconder em números e no currículo que ostentam, a coordenação do projeto eSocial não pode se dar ao luxo de cometer o mesmo erro. Para isso, como sugestão, poderia  abrir um canal para a coleta de críticas e sugestões diretamente no site oficial (www.esocial.gov.br).  Mas ouvir apenas não adianta. O Felipão também abriu o seu “canal” para as críticas e  simplesmente não as considerou. Dias antes do confronto com a Alemanha, muitos comentaristas e até os observadores da CBF alertaram que, para o Brasil ter alguma chance de vencer a Alemanha, teria que fortalecer o meio de campo jogando mais compactado. Felipão até que escutou, porém ignorou, e o resultado? Todos sabem... Um erro que ficará para a eternidade. A Seleção Brasileira foi engolida pela Alemanha porque estava mal treinada.

 

Então, não basta apenas ouvir as críticas e sugestões. É preciso ter a humildade para analisa-las de forma imparcial e aplica-las quando for o caso; cabe então a coordenação do eSocial, considerar que há milhares de profissionais com décadas de experiência, prontos para contribuir, sendo necessário apenas abrir um canal institucional para isso.

 

Os coordenadores do eSocial estariam dispostos a evitar este erro crasso do Felipão? Estariam dispostos a um diálogo em nível nacional para ajustar o eSocial?

 

 

 

Aplicar velhas receitas fora do contexto

 

Felipão é um treinador à “moda antiga”. Suas equipes sempre jogam com um atacante de referência; um típico centroavante de área, mas nem sempre essa será a solução para superar defesas de equipes que preferem jogar com um meio de campo muito técnico, compactado e forte na marcação, adotando esquemas com atacantes mais recuados que marcam e são rápidos no ataque, lembrando o estilo “ponta de lança”, porém com funções mais variadas, como é o caso da Alemanha e da Holanda.

 

Apesar das evidências, Felipão foi teimoso ao extremo, e a conta acabou sobrando para o Fred, que por sinal é um bom atacante, mas virou motivo de piadas nas redes sociais. Ao decidir manter o jogador em um esquema tático ultrapassado, que obviamente não encaixou quando a seleção teve que enfrentar uma equipe tão forte como a da Alemanha, o resultado foi desastroso.

 

 

O piloto do eSocial tem sido uma sombra do Fred

 

E o que significa, na prática, o projeto piloto do eSocial? Uma teimosa aplicação de uma receita comum do ambiente Sped, disposta com base na formação de grupos de trabalho com um foco inadequado por ser restrito; o piloto do eSocial não vem se ajustando simplesmente porque está fora do contexto, se considerarmos que somente estão participando do processo grandes instituições, que não representam sequer 1,5% da realidade tipológica dos empregadores que estarão sob o modelo operacional. Resultado: Foi desenvolvido algo totalmente inadequado para o restante dos empregadores (98,5%) e assim, o piloto tem feito um papel tão inútil e sujeito a críticas quanto o realizado por Fred, na seleção.

 

Assim, o “esquema tático” do piloto do eSocial, copiado do Sped, e jogado sem qualquer contextualização, resultou em uma sucessão de fracassos que se tornaram visíveis em cada adiamento que o projeto sofreu e se contarmos todas as promessas não cumpridas, qualificação cadastral que não funciona e desencontros de informações, eu diria que o eSocial está sendo goleado por 7 a 0; um gol para cada adiamento, um para a qualificação cadastral que não funciona, e outro simbolizando o desencontro de informações. Está pior que a tragédia do Mineirão... Um “mineiraço” digital.

 

 

 

 

É preciso se reencontrar com as próprias tradições

 

Qual a principal característica do futebol brasileiro, ao longo da história? Eu diria que é o toque de bola, com jogadores habilidosos, dribladores, com um meio de campo altamente criativo e atacantes da altíssima precisão e qualidade na finalização.

 

A seleção do Felipão é um dos notáveis exemplos de negação destas tradições futebolísticas brasileiras, porque apresentou um esquema tático bisonho baseado em chutões dos zagueiros, ignorando totalmente a criação do meio de campo, na esperança de encontrar o Oscar ou o Neymar na intermediária adversária torcendo para que “algo aconteça”.

 

Tirando isto, no pobre repertório de jogadas manjadas estava a famosa “bola parada” explorada nas faltas e nos escanteios. Paupérrimo para um futebol que já teve Pelé, Garrincha, Zito, Nilton Santos, Gerson, Rivelino, Tostão, Carlos Alberto Torres, Clodoaldo, Ademir da Guia, Falcão, Reinaldo, Zico, Sócrates, Romário, Bebeto , Ronaldo, entre outros craques inesquecíveis.

 

Se o meio de campo do Felipão é uma lástima, o que dizer do “meio de campo” do projeto eSocial? Está sendo conduzido por  burocratas do Sped, que mal sabem dar um passe de cinco metros quando se meteram a jogar no time da “escrituração trabalhista”; estão perdidos sem saber o que fazer, pois não municiam os atacantes, tampouco dão proteção à zaga. Lembram os  “pernas de pau”, na linguagem dos boleiros. 

 

O projeto eSocial não pode cometer os mesmos erros do Felipão no setor criativo, onde as jogadas mais importantes nascem; o “meio campo do eSocial” está nas empresas de software, nos conselhos de classe e nas entidades representativas. O mercado de serviços contábeis sempre foi estratégico e não pode ser tratado com desprezo.  A coordenação do eSocial precisa explorar ainda mais esta tradição, fortalecendo o setor e não investindo em coisas que confundirão os empregadores, como o sistema a ser disponibilizado no portal, tentando induzir ao equivocado conceito de que o próprio empresário fará a escrituração, quando sabemos que esta proposta é utópica e ao mesmo tempo, desagregadora.

 

Todavia, parece que uma luz está brilhando no fim do túnel. Não precisamos mesmo de um “mineiraço digital”. Um bom sinal sobre essa necessidade de mudança pode ser verificado na recente formação de um Grupo de Trabalho, formado por: Receita Federal do Brasil, Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Ministérios da Previdência e do Trabalho e Emprego, Fenacon, e entidades como Sescon/SP Firjan, CNI, Consif, CNC, Fiesc, CNA, Fiesp e CNCOOP, com o seguinte propósito:

 

Nas atividades do grupo estão ainda a estruturação do leiaute dos arquivos, a obrigatoriedade das informações, viabilidade operacional nas empresas e a estipulação de prazos e cronograma de implantação. A primeira reunião foi realizada no dia 2 de julho, em Brasília, e outras duas já estão marcadas para 7 e 26 de agosto, também na capital federal.

 

 

 

http://www.crcsc.org.br/comunicacao/noticias/3455-cfc-participa-de-grupo-de-trabalho-sobre-o-e-social

 

 

Muito bem. Aguardemos na torcida para que o bom senso prevaleça e que as instituições que compõem o novo GT possam realmente representar bem as críticas e as sugestões de milhares de profissionais que estão apreensivos com o projeto eSocial.

 

O projeto eSocial está em crise, contudo, assim como a nossa seleção, pode muito bem “dar a volta por cima”, se observar criteriosamente os erros cometidos e procurar as soluções mais adequadas.  Para isso, será preciso abandonar a fantasia que se construiu no piloto e enfrentar a realidade que não pode ser conhecida a partir das empresas que não sabem como se dá o cotidiano da maioria dos empregadores no país.

 

E o que fazer com o “meio de campo” improdutivo do eSocial? Os tais “burocratas” que se meteram a criar um modelo de escrituração trabalhista sem sequer ter fechado uma GFIP na vida? Por favor, deixem os craques jogarem... O povo clama!

 

Não precisamos de um “mineiraço” digital! Tudo é uma questão de fazer valer as palavras dos coordenadores Belmiro e Maia, que entendem ser o eSocial “uma construção coletiva”.

 

Que assim seja!

 

 

Vitória de Santo Antão, 13 de julho de 2014.

 

 

 

Leonardo Amorim

 

LLConsulte Soli Deo gloria